quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

O LEGAL E O MORAL*

*artigo publicado no Jornal Correio Popular
15/12/2011, A2, Caderno Opinião

            A maioria dos brasileiros teve um aumento salarial inferior a 10% em 2011. Se olharmos a questão das mulheres isso é ainda pior. Mas os vereadores de Campinas decidiram aumentar o próprio salário em 126%. A falta de dinheiro justificou o não que a prefeitura de Campinas deu aos servidores públicos municipal, mesmo que a categoria apenas reivindicasse 16% de aumento. Os vereadores, como servidores públicos que são (ou deveriam ser), perguntaram para seus chefes – o povo – se concordam com um aumento salarial desta magnitude? Legalmente podem fazer isso, pois se baseiam em outro aumento absurdo dos deputados federais, mas e moralmente?
            O ex-prefeito dr. Hélio é acusado de se omitir enquanto sua quadrilha desviava R$ 615 milhões dos cofres municipais, em especial da Sanasa. Conseguiram tal proeza também porque havia uma Câmara Municipal subserviente, que blindou o chefe do executivo e impediu a fiscalização. Eu como vereadora tentei por diversas vezes aprovar Comissão Especial de Investigação (CEI) e estas foram impedidas de serem instaladas por falta de apoio dos nobres edis. O que ganharia um Vereador ao impedir a fiscalização? Os Vereadores ao não cumprirem seu papel constitucional de fiscalizar o Executivo, o fazem em troca de indicações de cargos comissionados de livre nomeação. Você sabia caro cidadão, que o prefeito de Campinas pode nomear na “canetada” mais de 1400 cargos em comissão? Estes comissionados não passam por concurso público, não “picam cartão”, não prestam contas do que fazem (somente ao seu padrinho político). E estes comissionados fazem alguma coisa? Muitos inclusive foram denunciados como funcionários fantasmas.
            A minha revolta não é somente com o aumento de 126%. É perceber que os atuais vereadores, ao cassarem o prefeito, crêem que esta ação garantiu a purificação dos seus pecados. Mas como diria o sempre atual Padre Vieira, a salvação não é concedida sem o perdão e o perdão não ocorre sem a restituição do roubado. Será que, ao cassarem o prefeito, eles acreditam que merecem um aumento desta monta? Pelo contrário, com a cassação, eles assinaram seus atestados de incompetência, admitindo que erraram durante 7 anos com seus apoios irrestritos ao Dr. Hélio. Esta blindagem causou danos gravíssimos à cidade.
            Em sessão tumultuada e sob forte pressão popular, aprovaram o aumento de seus salários. O item da pauta estava camuflado por uma redação dissimulada (“Regulamenta o artigo 10 da Lei Orgânica do Município para os anos de 2.013 a 2.016”), além de contar com o desconhecimento dos presentes sobre os trâmites das matérias. De maneira covarde, alguns vereadores levaram para o plenário da Câmara muitos moradores que achavam que projetos de seu interesse seriam votados. Em meio à manifestação destas pessoas, votaram medrosamente o aumento. Esta cena, de dar inveja às óperas bufas, aconteceu na frente de todos. Um verdadeiro atentado a fé pública. Depois da votação começou o óbvio tumulto e os vereadores sairam do plenário rindo da situação, não sem antes escapar da chuva de ovos do povo escandalizado.
            O antropólogo Roberto da Matta disse que “o problema é entre a transparência e a opacidade. A transparência entre aquilo que o governo faz e o que a sociedade sabe. O governo tem que prestar contas”. É evidente a falta de transparência tanto por parte do Executivo quanto do Legislativo campineiro. Chegamos ao final de 2011 e mais uma vez Campinas volta a ser manchete nacional. Primeiro, com os escândalos de corrupção e a cassação do dr. Hélio e agora com a aprovação de aumento de 126% do salário dos vereadores.
            Em 2012, estes mesmos vereadores sairão, escondidos atrás de seus coeficientes eleitorais, em busca de votos. A indignação de hoje deve se transformar em ação no futuro. O Judiciário em nosso país pode ser lento, mas poderemos, já no ano que vem sermos os melhores juízes. Podemos mostrar o quanto estamos insatisfeitos com a pior legislatura que Campinas já teve.

Marcela Moreira, ex-vereadora pelo PSOL/Campinas. Coordenadora do Instituto Voz Ativa

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